O Novo Plano Nacional de Educação em Debate
A Comissão Especial da Câmara dos Deputados aprovou, na última quarta-feira (10), um projeto de lei que institui o novo Plano Nacional de Educação (PNE) para a próxima década. Essa proposta, que visa transformar a gestão educacional no Brasil, é comparada ao Sistema Único de Saúde (SUS) pela sua ambição e abrangência. O novo sistema, denominado Sistema Nacional de Educação (SNE), promete revolucionar a forma como a educação é administrada no país, estabelecendo um marco regulatório sem precedentes.
O projeto agora segue para análise no Senado Federal e, se aprovado, estabelece um cronograma de metas audacioso, incluindo um aumento gradual do investimento público em educação. O objetivo é elevar esse investimento para 7,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em sete anos, alcançando 10% até o final da década. Além disso, a proposta define metas concretas, como a universalização da pré-escola em dois anos e a alfabetização de 80% das crianças até o segundo ano do ensino fundamental em cinco anos. Também está nos planos conectar 75% das escolas públicas à internet de alta velocidade dentro desse mesmo período.
Críticas e Ceticismo no Cenário Educacional
Apesar do otimismo que permeia as discussões oficiais, um ceticismo profundo ecoa no universo da educação. A secretária de Educação de Goiás, Fátima Gavioli, que contribuiu para a elaboração do PNE anterior, expressa sua preocupação com a eficácia do novo plano. Em entrevista, ela afirmou: “O Brasil é o país dos documentos. Adora afirmar que agora vai acontecer porque foi criado um plano, foi criada uma lei.” Sua crítica é fundamentada na realidade enfrentada nas salas de aula.
Gavioli destaca que somente cerca de 30% das metas do plano anterior (2014-2024) foram cumpridas, questionando a efetividade da cultura de planejamento sem execução. “Quantos professores realmente leram o PNE que vigorou por dez anos?”, provoca, evidenciando a desconexão entre a formulação de políticas e suas aplicações práticas.
Oportunidades de Mudança e Visões Contrapostas
Por outro lado, existem vozes que enxergam no novo PNE uma chance real de transformação. O professor doutor João Ferreira de Oliveira, da Universidade Federal de Goiás, vê a criação do SNE como um marco civilizatório que pode romper a fragmentação histórica dos sistemas de ensino. “A ideia é que funcione na lógica da colaboração”, ressalta Oliveira, acreditando que esse sistema pode corrigir as desigualdades regionais e garantir o direito à educação de qualidade.
Essa visão é apoiada pela organização Todos Pela Educação, que reconheceu, em uma análise do projeto, avanços significativos, como o fortalecimento do monitoramento e a introdução de planos de ação bienais. Para o professor e a entidade, a efetividade do novo PNE depende de um compromisso político e orçamentário robusto, que transforme ideais em ações concretas, evitando que o projeto permaneça apenas no papel.
Desafios para Implementação e Sustentabilidade do Plano
Um dos principais desafios do novo PNE é a implementação efetiva do SNE. Oliveira explica que o Brasil opera atualmente com “sistemas de ensino” desconectados, onde cada estado possui seu próprio modelo. O SNE busca articular esses sistemas de maneira democrática, mas a secretária Gavioli alerta que sem a devida monitorização e previsão orçamentária, as metas podem se tornar inalcançáveis.
Ela critica a fixação de porcentagens ambiciosas, como 85% ou até 100% para a alfabetização, que considera “perigosas e irreais”, podendo levar a consequências administrativas para os gestores caso não sejam atingidas. “A saída que eu tenho? Se eu alfabetizar 85%, eu vou ‘alfabetizar’ 100% no documento”, ironiza, refletindo sobre a falta de recursos que afeta a implementação das políticas públicas.
Perspectivas Futuras e o Papel do Senado
O projeto agora está no Senado, onde pode ser ajustado antes de sua aprovação final. O ministro da Educação, Camilo Santana, tem expectativa de que o projeto seja aprovado ainda este ano. Contudo, o verdadeiro desafio será criar uma conexão entre o ambicioso SNE e a realidade das escolas brasileiras. Enquanto o governo foca no planejamento de longo prazo, gestores e educadores, como Gavioli, clamam por um apoio financeiro efetivo e compatível, vital para a execução das propostas.
A próxima década será crucial para determinar se o novo PNE se transformará em uma ferramenta de mudança real ou se será apenas mais um documento que ficará guardado, como tem sido a história da educação no Brasil. O futuro de milhões de estudantes está em jogo e depende das decisões tomadas nas próximas etapas desse projeto ambicioso.
